quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Skinhead Reggae


 Skinhead Reggae 01
   Essa história começa na segunda metade dos anos 60, simultaneamente em duas ilhas: Jamaica e Reino Unido. Em Kingston o mercado fonográfico estava á toda e a cada dia surgiam novos artistas tocando o ritmo local que acabava de surgir na ilha, o ska. Os artistas e selos estavam crescendo e seu campo de atuação também, e o ritmo local da ilha começou a se espalhar por outros cantos do mundo e em especial em outra ilha, o Reino Unido, mais precisamente na Inglaterra. A cultura mod, que trazia scooters, ternos alinhados e gosto pela música negra (R’n’B, Jazz e Soul) estava estourada na terra da rainha e os moleques ligados a essa cultura começaram a ouvir também, além dos ritmos negros norte-americanos, o ska, trazido pelas mãos dos imigrantes jamaicanos que vivam em terras inglesas. O novo ritmo jamaicano ganhou destaque no país e foi inclusive apelidado de bluebeat pelos locais, e deu nome ao selo inglês. Seguramente pode-se afirmar que se não fossem os mods o ska não alcançaria o sucesso que alcançou nas paradas inglesas e ao mesmo tempo pode-se dizer também que a cultura mod foi muito influenciada pelo ritmo jamaicanos (inclusive no visual, adaptando o pork pie dos rudies a vestimenta mod). Prince Buster foi o primeiro a emplacar um som no top 40 inglês, com Al Capone. Como já foi citado acima, sem os mods o ska não seria o que foi, e o mesmo se aplica ao reggae e aos skinheads. Com o passar do tempo a cultura mod foi se dividindo em dois… Hard mods e psicodélicos. Os mods mais psicodélicos, cabeludos, estudantes de moda que estavam começando a ouvir sons diferentes das origens da cultura mod. E os hard mods que iam ao estádio de futebol fazer arruaça, mais rueiros e briguentos, que a cada dia mais estavam envolvidos com a música jamaicana e que mais tarde ganhariam o apelido de skinheads por cortarem seus cabelos cada vez mais curtos em resposta aos mods psicodélicos e aos hippies que surgiam com seus discursos paz-e-amor. Nota-se que a cultura skinhead NADA tinha a ver com racismo, pelo contrário, eram garotos amantes da música negra e que só apareceram graças à essa música e à cultura mod… ISSO é a cultura skinhead ORIGINAL, tudo o que surgiu depois disso é plágio, e plágio mal feito! Enquanto isso, na Jamaica a música se modificava rapidamente e o ska já não tinha a mesma batida… A nova batida que surgia foi chamada de rocksteady e logo deu origem ao ritmo que fez a fama da ilha: O reggae - que teve seus anos de ouro na década de 60 até o começo da década de 70, com MILHARES de discos produzidos e surgimento de novos selos, não só na jamaica (Clement “Coxsone” Dodd e sua Studio One e Duke Reid com a Treasure Isle) como também na Inglaterra (Island e mais tarde Trojan Records que surgiria em parceria com a Island em 1968, Pama e muitas, mas muitas subgravadoras) . Ao contrário do que a maioria das pessoas pensam, o reggae não tinha nada a ver com o rastafarianismo no começo, as letras falavam basicamente do cotidiano dos artistas, citações a filmes, famosos da época, mas principalmente eram temas de amor… A musicalidade bastante característica, com teclados e riffs de baixo dando o compasso do som mostrava claramente que o novo ritmo era uma evolução do ska… E foi esse reggae que fez a cabeça dos moleques na Inglaterra na segunda metade da década. 66, 67… É nessa época que começa a febre do reggae no país. Novamente os imigrantes jamaicanos residentes na Inglaterra, mas desta vez junto com os skinheads foram os grandes responsáveis pelo estouro do ritmo na terra da rainha. Enquanto os skins iam as grandes lojas e pediam cada vez mais discos do novo ritmo, os jamaicanos faziam a mesma coisa nas lojas independentes e de pequeno porte que se instalavam nos bairros mais afastados e ambos pediam aos djs que o novo ritmo fosse tocado. Isso foi o que fez o reggae estourar. Nomes de artistas que residiam na Inglaterra há algum tempo e também de artistas que ainda viviam na Jamaica, como Laurel Aitken, Clancy Eccles, The Paragons, Toots and The Maytals, Desmond Dekker, Jimmy Cliff, The Heptones, Phyllis Dillon e até os Wailing Wailers (Bob Marley, Peter Tosh e Bunny Wailer) faziam esse tipo de reggae, que mais tarde foi denominado “Skinhead Reggae” (pela razão óbvia de terem sido os skinheads os maiores fãs desse ritmo na época) ou “Early Reggae”. E assim como os moleques de Londres sabiam da existência dos seus músicos favoritos, os músicos da Kingston começaram a saber da existência dos garotos de cabeça raspada que veneravam a música jamaicana. Isso fez com que vários produtores ingleses começassem a fazer reggae na Inglaterra, 100% produzido por lá do mesmo jeito que Coxsone fazia na Jamaica, com uma banda “padrão” para o estúdio da gravadora ou do produtor e artistas indo e gravando o vocal (na época graças as milhares de subgravadoras, cada produtor tinha seu próprio selo e até os seus “allstars” como é o caso de Hot Rod All Stars, Joe’s All Stars e Pama Dice) e fez também com que os artistas começassem a escrever temas para os skinheads, como “Skinheads a bash them” escrito por Laurel Aitken e interpretado por Claudette and The Corporation, que nada mais é que o Symarip com a Claudette cantando, “Hooligan” dos Wailing Wailers, e até mesmo músicas instrumentais mas com títulos que sugeriam a ligação, que é o caso de “Skinheads don’t fear” dos já citados Hot Rod All Stars… A banda Symarip, também conhecida como Pyramids ou Seven Letters, que fazia reggae na época lançou inclusive um disco intitulado “skinhead moonstomp” (o mais conhecido e aclamado pelo grande público, mas longe de ser o melhor), que trazia do começo ao fim músicas citando a subcultura inglesa… Uma jogada e tanto, já que o reggae já estava estourado no país graças aos “homenageados”… Na Inglaterra começavam a surgir artistas tocando o som vindo da jamaica, com destaque para os produtores e também músicos Dice The Boss, Joe The Boss e Joe Gibbs, mas também para Judge Dread, o primeiro branco a emplacar um hit no top de reggae, já nos 70. Em 1969 a cultura skinhead alcançou seu auge… Uma moda desde os bairros mais pobres até os mais fartos que se espalhou pela Inglaterra e trazia com ela o amor pela música negra, principalmente jamaicana. Com o passar do tempo a cultura skinhead foi “evoluindo” e a partir dos anos 70 foram surgindo novos “tipos” de skinhead, o suedehead, o smoothie e aos poucos a moda skinhead foi passando na Inglaterra. O reggae também não era mais o mesmo. Nas terras da rainha, o reggae estava cada vez mais estourado e popular, ganhando gravações com orquestras e sob novas influências da década que surgia virou o Club Reggae. Enquanto isso, nas ruas de Kingston, o rastafarianismo se popularizava cada vez mais e vários artistas começaram a misturar temas religiosos a sua música… Assim nascia o roots reggae, mas isso já é outra história…


Skinhead Reggae 02
   Pode se dizer que todo Skinhead Reggae é Early Reggae, mas nem todo Early Reggae é Skinhead Reggae. Não basta ter sido gravado no final de 1968 pós-rocksteady e ter o shuffle clássico da guitarra, são muitas coisas que fazem um som ser “skinhead”.
   Skinhead Reggae é um gênero riquíssimo, que possui diversas subdivisões escondidas. O Reggae em sua forma mais primitiva foi criada por um senhor jamaicano chamado Toots Hibbert em 1968, mas isso foi só o ponta pé inicial, foi no ano seguinte, e em outro lugar, que tudo aconteceu.
   O marco é na Inglaterra 1969, ano que o ritmo se consolidou, a maioria das gravações, e com certeza as melhores, são creditadas desse ano. Diversos outros fatores também ajudaram a formar o tal espírito 69. É mais que uma simples data, foi em 1969 que as diferenças raciais estavam sendo deixadas de lado, a música ganhava cada vez mais força, jovens estavam nas ruas lutando pelos seus direitos em diversos países, era o final da década mais proeminente para a música mundial, e o homem alcançava mais espaço do que nunca, ele pisava na Lua!
   Uma das levadas que mais marcaram esse ritmo foram os tunes ditos de lua, mais conhecidos como “Moonstomp”, o fraseado do baixo repetido constantemente fazia que os jovens da época dançassem imitando um astronauta caminhando na lua lentamente, era o assunto que mais se noticiava nas mídias e os jamaicanos não poderiam deixar isso passar em branco..os Hippy Boys gravaram um tema instrumental chamado “Neil Armstrong”, homenageando o primeiro astronauta que chegou lá.
   Mantendo uma levada parecida temos as produções de Laurel Aitken pelo selo Nu Beat da Pama Records, gravadora importantíssima para disseminação do Skinhead Reggae. As músicas gravadas por Laurel essa época tinham um baixo ainda mais lento e constante do que os tunes Moonstomp, chegando a ser até maçante de se ouvir por muito tempo, é um som mais cabeçudo mesmo, que facilitava a dança dos jovens ingleses que não tinham o swing caribenho. Um clássico dessa época é “Apollo 12” (referência direta ao projeto da NASA “Apollo” que mandava naves espaciais para lua) cantada por Laurel , sem dúvida é um dos sons mais exaltador dos jovens ingleses, que também ganhou o nome de “Skinhead Invasion”.
   É necessário também reconhecer a importância dos produtores no Skinhead Reggae, foram eles que tomaram as rédias do ritmo e começaram a produzir com suas bandas de estúdio instrumentais e versões em seus respectivos selos, isso fez com que o Skinhead Reggae evoluísse das linhas de baixo marcadas pela rápida guitarra para belos instrumentais tendo como principal solista os organistas com seus brilhantes Hammonds. Os melhores produtores sempre estavam a frente de um selo e lançavam seus próprios sons, cada um com sua marca registrada.
   Duas gravadoras foram responsáveis por manter o Skinhead Reggae no topo dos charts ingleses, a Pama e a Trojan. Sem elas a história do Skinhead Reggae não seria a mesma, talvez esse estilo musical nem chegasse a existir se não fosse os lançamentos das duas, elas estão para o Skinhead Reggae assim como a Motown e a Stax estão para o Soul.
   Pela Pama os produtores que se destacaram foram o Bunny Lee com seu selo Unity onde chegou a lançar vários instrumentais, destaque para o inusitado tema “Ivan Hitler The Conqueror”, hammond assassino! Foi das produções de Bunny Lee que saiu o clássico do Skinhead Reggae “Wet Dream” cantada por Max Romeo, podemos dizer que é um som “skinhead slackness” estilo que Lloyd Chamers também gravou. Esse single do Max Romeo chegou a vender 250.000 mil cópias. O produtor aproveitou a base e também já lançou no mesmo riddim a versão com o trombone solando chamada “Daydream” com os Bunny Lee All Stars.
   Continuando nas subsidiárias da Pama, uma outra com bem menos lançamentos que a Unity mas com bastante importância foi o selo Success do produtor jamaicano Rupie Edwards, aqui também ele mantinha uma banda de estúdio que gravava suas versões instrumentais, BOSS! Foi com Rupie que Gregory Isaacs cantou seus primeiros sons nesse novo ritmo, uma do rei do lovers dessa época lançada pela Success é a acelerada “Don't Let Me Suffer”. Uma curiosidade é que Gregory Isaacs em 1969 já cantava porém com o pseudônimo de Winston Sinclair, pra quem ficou curioso, escutem a faixa “Another Heartache” da nossa coletanêa Bak to 69' Vol. 3., destaque também para a rápida guitarra total distorcida.
   Nessa época o mestre Lee Perry também produzia bastante música instrumental, nunca mencionando o nome skinhead nas canções mas com a mesma pegada musical, sua banda de estúdio foi a base da música jamaicana, os Upsetters que tinham na formação os irmãos Barrett além de Glen Adams no órgão, e na guitarra Alva Lewis, que chegou a cantar alguns rocksteadys no início da carreira, os lançamentos de Perry pela Pama saíam pelo selo Punch.
   Lambert Briscoe dono do sound system Hot Rod situado no subúrbio de Londres, mais precisamente em Brixton, local onde moravam muito imigrantes caribenhos, recebeu da gravadora Trojan em 1970 um selo de presente com o mesmo nome de seu Sound. Por esse selo ele gravou alguns temas instrumentais que viraram febre entre os skinheads, a base de todos os sons era a banda de estúdio Hot Rod All Stars (Cimarons) dirigida por Briscoe.
   Ele também produziu e lançou vários clássicos do Skinhead Reggae pela label Torpedo Records de Eddie Grants, também com sua banda de estúdio Hot Rod All Stars. Com certeza é uma dos selos mais consagrados de todos os tempos, pois lançou muito material destinado aos skinheads, hoje em dia os compactos originais são caríssimos, pois são itens obrigatórios na coleção de aficionados pelo gênero. Boss Sounds!
   Outro produtor de sucesso da Trojan foi Joe Mansano, nascido em Trinidad e Tobago, Mansano se mudou para Londres em 1963 e viveu toda a evolução do Blue Beat até a explosão do Skinhead Reggae. O cara tinha uma loja de discos e era tão respeitado nesse meio que recebeu da Trojan um selo com seu nome: “JOE”, responsa?
   A maioria das gravações dele tinham como banda de apoio os Cimarons, banda que lançou bons discos de roots anos mais tarde, e também algumas diferentes formações de músicos de estúdio que gravando para Mansano levavam o nome de Joe All Stars. O trombonista Rico Rodriguez também fazia participações constantes.
   Fora do eixo Pama-Trojan outros produtores não menos importantes que merecem ser ao menos citados aqui são Leslie Kong (Berveley's), Clancy Eccles (Clandisc), Harry Johnson (Harry J.), Sir Collins (Down Beat), Joe Gibbs (Amalgamated ), Derrick Harriott (Crystal), Harry Mudie (Moodisc), Clive Chin (Randys).
   Outro nome de peso do Skinhead Reggae foi o produtor/cantor/organista Lloyd Charmers. Ao lado dos Hippy Boys ele lançou diversos temas instrumentais que eram febre entre os skinheads, o engraçado era que o Reggae feito por Charmers era extremamente psicodélico, com vários timbres de órgão e “letras” sem nexo algum, bem paradoxal se formos pensar que a cultura skinhead surgiu para diferenciar os hard mods dos mods que viriam a se transformar em hippies que preferiam ouvir rock psicodélico. Mas isso não tira nenhum mérito de Lloyd Charmers, o som do cara era duma qualidade tão alta que mesmo ele considerando sua música “Psychedelic Reggae” os skinheads continuavam a adorar o som dele, sem dúvida alguma ele foi um dos principais nomes do estilo.
   O Skinhead Reggae carrega todo um espírito de rebeldia da juventude, a guitarra tocada rápida se mistura com o hammond que segura as notas mais agudas gerando uma sensação de agitação total. Era esse sentimento que levava os jovens britânicos aos clubs toda semana. A música era a cultura skinhead, e eles amaram esse gênero musical que era feito para eles, e que levava o nome deles!

 Fontes: http://youandmeonajamboree.blogspot.com/2006/07/um-pouco-sobre-o-skinhead-reggae.html 
 http://youandmeonajamboreedownloads.blogspot.com.br/p/skinhead-reggae.html

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