Skinhead Reggae 01
Essa história começa na segunda metade dos anos 60, simultaneamente em
duas ilhas: Jamaica e Reino Unido. Em Kingston o mercado fonográfico
estava á toda e a cada dia surgiam novos artistas tocando o ritmo local
que acabava de surgir na ilha, o ska. Os artistas e selos estavam
crescendo e seu campo de atuação também, e o ritmo local da ilha começou
a se espalhar por outros cantos do mundo e em especial em outra ilha, o
Reino Unido, mais precisamente na Inglaterra. A cultura mod, que trazia
scooters, ternos alinhados e gosto pela música negra (R’n’B, Jazz e
Soul) estava estourada na terra da rainha e os moleques ligados a essa
cultura começaram a ouvir também, além dos ritmos negros
norte-americanos, o ska, trazido pelas mãos dos imigrantes jamaicanos
que vivam em terras inglesas. O novo ritmo jamaicano ganhou destaque no
país e foi inclusive apelidado de bluebeat pelos locais, e deu nome ao
selo inglês. Seguramente pode-se afirmar que se não fossem os mods o ska
não alcançaria o sucesso que alcançou nas paradas inglesas e ao mesmo
tempo pode-se dizer também que a cultura mod foi muito influenciada pelo
ritmo jamaicanos (inclusive no visual, adaptando o pork pie dos rudies a
vestimenta mod). Prince Buster foi o primeiro a emplacar um som no top
40 inglês, com Al Capone. Como já foi citado acima, sem os mods o ska
não seria o que foi, e o mesmo se aplica ao reggae e aos skinheads. Com o
passar do tempo a cultura mod foi se dividindo em dois… Hard mods e
psicodélicos. Os mods mais psicodélicos, cabeludos, estudantes de moda
que estavam começando a ouvir sons diferentes das origens da cultura
mod. E os hard mods que iam ao estádio de futebol fazer arruaça, mais
rueiros e briguentos, que a cada dia mais estavam envolvidos com a
música jamaicana e que mais tarde ganhariam o apelido de skinheads por
cortarem seus cabelos cada vez mais curtos em resposta aos mods
psicodélicos e aos hippies que surgiam com seus discursos paz-e-amor.
Nota-se que a cultura skinhead NADA tinha a ver com racismo, pelo
contrário, eram garotos amantes da música negra e que só apareceram
graças à essa música e à cultura mod… ISSO é a cultura skinhead
ORIGINAL, tudo o que surgiu depois disso é plágio, e plágio mal feito!
Enquanto isso, na Jamaica a música se modificava rapidamente e o ska já
não tinha a mesma batida… A nova batida que surgia foi chamada de
rocksteady e logo deu origem ao ritmo que fez a fama da ilha: O reggae -
que teve seus anos de ouro na década de 60 até o começo da década de
70, com MILHARES de discos produzidos e surgimento de novos selos, não
só na jamaica (Clement “Coxsone” Dodd e sua Studio One e Duke Reid com a
Treasure Isle) como também na Inglaterra (Island e mais tarde Trojan
Records que surgiria em parceria com a Island em 1968, Pama e muitas,
mas muitas subgravadoras) . Ao contrário do que a maioria das pessoas
pensam, o reggae não tinha nada a ver com o rastafarianismo no começo,
as letras falavam basicamente do cotidiano dos artistas, citações a
filmes, famosos da época, mas principalmente eram temas de amor… A
musicalidade bastante característica, com teclados e riffs de baixo
dando o compasso do som mostrava claramente que o novo ritmo era uma
evolução do ska… E foi esse reggae que fez a cabeça dos moleques na
Inglaterra na segunda metade da década. 66, 67… É nessa época que começa
a febre do reggae no país. Novamente os imigrantes jamaicanos
residentes na Inglaterra, mas desta vez junto com os skinheads foram os
grandes responsáveis pelo estouro do ritmo na terra da rainha. Enquanto
os skins iam as grandes lojas e pediam cada vez mais discos do novo
ritmo, os jamaicanos faziam a mesma coisa nas lojas independentes e de
pequeno porte que se instalavam nos bairros mais afastados e ambos
pediam aos djs que o novo ritmo fosse tocado. Isso foi o que fez o
reggae estourar. Nomes de artistas que residiam na Inglaterra há algum
tempo e também de artistas que ainda viviam na Jamaica, como Laurel
Aitken, Clancy Eccles, The Paragons, Toots and The Maytals, Desmond
Dekker, Jimmy Cliff, The Heptones, Phyllis Dillon e até os Wailing
Wailers (Bob Marley, Peter Tosh e Bunny Wailer) faziam esse tipo de
reggae, que mais tarde foi denominado “Skinhead Reggae” (pela razão
óbvia de terem sido os skinheads os maiores fãs desse ritmo na época) ou
“Early Reggae”. E assim como os moleques de Londres sabiam da
existência dos seus músicos favoritos, os músicos da Kingston começaram a
saber da existência dos garotos de cabeça raspada que veneravam a
música jamaicana. Isso fez com que vários produtores ingleses começassem
a fazer reggae na Inglaterra, 100% produzido por lá do mesmo jeito que
Coxsone fazia na Jamaica, com uma banda “padrão” para o estúdio da
gravadora ou do produtor e artistas indo e gravando o vocal (na época
graças as milhares de subgravadoras, cada produtor tinha seu próprio
selo e até os seus “allstars” como é o caso de Hot Rod All Stars, Joe’s
All Stars e Pama Dice) e fez também com que os artistas começassem a
escrever temas para os skinheads, como “Skinheads a bash them” escrito
por Laurel Aitken e interpretado por Claudette and The Corporation, que
nada mais é que o Symarip com a Claudette cantando, “Hooligan” dos
Wailing Wailers, e até mesmo músicas instrumentais mas com títulos que
sugeriam a ligação, que é o caso de “Skinheads don’t fear” dos já
citados Hot Rod All Stars… A banda Symarip, também conhecida como
Pyramids ou Seven Letters, que fazia reggae na época lançou inclusive um
disco intitulado “skinhead moonstomp” (o mais conhecido e aclamado pelo
grande público, mas longe de ser o melhor), que trazia do começo ao fim
músicas citando a subcultura inglesa… Uma jogada e tanto, já que o
reggae já estava estourado no país graças aos “homenageados”… Na
Inglaterra começavam a surgir artistas tocando o som vindo da jamaica,
com destaque para os produtores e também músicos Dice The Boss, Joe The
Boss e Joe Gibbs, mas também para Judge Dread, o primeiro branco a
emplacar um hit no top de reggae, já nos 70. Em 1969 a cultura skinhead
alcançou seu auge… Uma moda desde os bairros mais pobres até os mais
fartos que se espalhou pela Inglaterra e trazia com ela o amor pela
música negra, principalmente jamaicana. Com o passar do tempo a cultura
skinhead foi “evoluindo” e a partir dos anos 70 foram surgindo novos
“tipos” de skinhead, o suedehead, o smoothie e aos poucos a moda
skinhead foi passando na Inglaterra. O reggae também não era mais o
mesmo. Nas terras da rainha, o reggae estava cada vez mais estourado e
popular, ganhando gravações com orquestras e sob novas influências da
década que surgia virou o Club Reggae. Enquanto isso, nas ruas de
Kingston, o rastafarianismo se popularizava cada vez mais e vários
artistas começaram a misturar temas religiosos a sua música… Assim
nascia o roots reggae, mas isso já é outra história…
Skinhead Reggae 02
Pode se dizer que todo
Skinhead Reggae é Early Reggae, mas nem todo Early Reggae é Skinhead
Reggae. Não basta ter sido gravado no final de 1968 pós-rocksteady e ter
o shuffle clássico da guitarra, são muitas coisas que fazem um som ser
“skinhead”.
Skinhead Reggae é
um gênero riquíssimo, que possui diversas subdivisões escondidas. O
Reggae em sua forma mais primitiva foi criada por um senhor jamaicano
chamado Toots Hibbert em 1968, mas isso foi só o ponta pé inicial, foi
no ano seguinte, e em outro lugar, que tudo aconteceu.
O marco é na
Inglaterra 1969, ano que o ritmo se consolidou, a maioria das gravações,
e com certeza as melhores, são creditadas desse ano. Diversos outros
fatores também ajudaram a formar o tal espírito 69. É mais que uma
simples data, foi em 1969 que as diferenças raciais estavam sendo
deixadas de lado, a música ganhava cada vez mais força, jovens estavam
nas ruas lutando pelos seus direitos em diversos países, era o final da
década mais proeminente para a música mundial, e o homem alcançava mais
espaço do que nunca, ele pisava na Lua!
Uma das levadas
que mais marcaram esse ritmo foram os tunes ditos de lua, mais
conhecidos como “Moonstomp”, o fraseado do baixo repetido constantemente
fazia que os jovens da época dançassem imitando um astronauta
caminhando na lua lentamente, era o assunto que mais se noticiava nas
mídias e os jamaicanos não poderiam deixar isso passar em branco..os
Hippy Boys gravaram um tema instrumental chamado “Neil Armstrong”,
homenageando o primeiro astronauta que chegou lá.
Mantendo uma
levada parecida temos as produções de Laurel Aitken pelo selo Nu Beat da
Pama Records, gravadora importantíssima para disseminação do Skinhead
Reggae. As músicas gravadas por Laurel essa época tinham um baixo ainda
mais lento e constante do que os tunes Moonstomp, chegando a ser até
maçante de se ouvir por muito tempo, é um som mais cabeçudo mesmo, que
facilitava a dança dos jovens ingleses que não tinham o swing caribenho.
Um clássico dessa época é “Apollo 12” (referência direta ao projeto da
NASA “Apollo” que mandava naves espaciais para lua) cantada por Laurel ,
sem dúvida é um dos sons mais exaltador dos jovens ingleses, que também
ganhou o nome de “Skinhead Invasion”.
É
necessário também reconhecer a importância dos produtores no Skinhead
Reggae, foram eles que tomaram as rédias do ritmo e começaram a produzir
com suas bandas de estúdio instrumentais e versões em seus respectivos
selos, isso fez com que o Skinhead Reggae evoluísse das linhas de baixo
marcadas pela rápida guitarra para belos instrumentais tendo como
principal solista os organistas com seus brilhantes Hammonds. Os
melhores produtores sempre estavam a frente de um selo e lançavam seus
próprios sons, cada um com sua marca registrada.
Duas gravadoras
foram responsáveis por manter o Skinhead Reggae no topo dos charts
ingleses, a Pama e a Trojan. Sem elas a história do Skinhead Reggae não
seria a mesma, talvez esse estilo musical nem chegasse a existir se não
fosse os lançamentos das duas, elas estão para o Skinhead Reggae assim
como a Motown e a Stax estão para o Soul.
Pela Pama os
produtores que se destacaram foram o Bunny Lee com seu selo Unity onde
chegou a lançar vários instrumentais, destaque para o inusitado tema
“Ivan Hitler The Conqueror”, hammond assassino! Foi das produções de
Bunny Lee que saiu o clássico do Skinhead Reggae “Wet Dream” cantada por
Max Romeo, podemos dizer que é um som “skinhead slackness” estilo que
Lloyd Chamers também gravou. Esse single do Max Romeo chegou a vender
250.000 mil cópias. O produtor aproveitou a base e também já lançou no
mesmo riddim a versão com o trombone solando chamada “Daydream” com os
Bunny Lee All Stars.
Continuando nas
subsidiárias da Pama, uma outra com bem menos lançamentos que a Unity
mas com bastante importância foi o selo Success do produtor jamaicano
Rupie Edwards, aqui também ele mantinha uma banda de estúdio que gravava
suas versões instrumentais, BOSS! Foi com Rupie que Gregory Isaacs
cantou seus primeiros sons nesse novo ritmo, uma do rei do lovers dessa
época lançada pela Success é a acelerada “Don't Let Me Suffer”. Uma
curiosidade é que Gregory Isaacs em 1969 já cantava porém com o
pseudônimo de Winston Sinclair, pra quem ficou curioso, escutem a faixa
“Another Heartache” da nossa coletanêa Bak to 69' Vol. 3., destaque
também para a rápida guitarra total distorcida.
Nessa época o
mestre Lee Perry também produzia bastante música instrumental, nunca
mencionando o nome skinhead nas canções mas com a mesma pegada musical,
sua banda de estúdio foi a base da música jamaicana, os Upsetters que
tinham na formação os irmãos Barrett além de Glen Adams no órgão, e na
guitarra Alva Lewis, que chegou a cantar alguns rocksteadys no início da
carreira, os lançamentos de Perry pela Pama saíam pelo selo Punch.
Lambert Briscoe
dono do sound system Hot Rod situado no subúrbio de Londres, mais
precisamente em Brixton, local onde moravam muito imigrantes caribenhos,
recebeu da gravadora Trojan em 1970 um selo de presente com o mesmo
nome de seu Sound. Por esse selo ele gravou alguns temas instrumentais
que viraram febre entre os skinheads, a base de todos os sons era a
banda de estúdio Hot Rod All Stars (Cimarons) dirigida por Briscoe.
Ele também
produziu e lançou vários clássicos do Skinhead Reggae pela label Torpedo
Records de Eddie Grants, também com sua banda de estúdio Hot Rod All
Stars. Com certeza é uma dos selos mais consagrados de todos os tempos,
pois lançou muito material destinado aos skinheads, hoje em dia os
compactos originais são caríssimos, pois são itens obrigatórios na
coleção de aficionados pelo gênero. Boss Sounds!
Outro produtor de
sucesso da Trojan foi Joe Mansano, nascido em Trinidad e Tobago,
Mansano se mudou para Londres em 1963 e viveu toda a evolução do Blue
Beat até a explosão do Skinhead Reggae. O cara tinha uma loja de discos e
era tão respeitado nesse meio que recebeu da Trojan um selo com seu
nome: “JOE”, responsa?
A maioria das
gravações dele tinham como banda de apoio os Cimarons, banda que lançou
bons discos de roots anos mais tarde, e também algumas diferentes
formações de músicos de estúdio que gravando para Mansano levavam o nome
de Joe All Stars. O trombonista Rico Rodriguez também fazia
participações constantes.
Fora do eixo
Pama-Trojan outros produtores não menos importantes que merecem ser ao
menos citados aqui são Leslie Kong (Berveley's), Clancy Eccles
(Clandisc), Harry Johnson (Harry J.), Sir Collins (Down Beat), Joe Gibbs
(Amalgamated ), Derrick Harriott (Crystal), Harry Mudie (Moodisc),
Clive Chin (Randys).
Outro nome de
peso do Skinhead Reggae foi o produtor/cantor/organista Lloyd Charmers.
Ao lado dos Hippy Boys ele lançou diversos temas instrumentais que eram
febre entre os skinheads, o engraçado era que o Reggae feito por
Charmers era extremamente psicodélico, com vários timbres de órgão e
“letras” sem nexo algum, bem paradoxal se formos pensar que a cultura
skinhead surgiu para diferenciar os hard mods dos mods que viriam a se
transformar em hippies que preferiam ouvir rock psicodélico. Mas isso
não tira nenhum mérito de Lloyd Charmers, o som do cara era duma
qualidade tão alta que mesmo ele considerando sua música “Psychedelic
Reggae” os skinheads continuavam a adorar o som dele, sem dúvida alguma
ele foi um dos principais nomes do estilo.
O Skinhead Reggae
carrega todo um espírito de rebeldia da juventude, a guitarra tocada
rápida se mistura com o hammond que segura as notas mais agudas gerando
uma sensação de agitação total. Era esse sentimento que levava os jovens
britânicos aos clubs toda semana. A música era a cultura skinhead, e
eles amaram esse gênero musical que era feito para eles, e que levava o
nome deles!
Fontes: http://youandmeonajamboree.blogspot.com/2006/07/um-pouco-sobre-o-skinhead-reggae.html
http://youandmeonajamboreedownloads.blogspot.com.br/p/skinhead-reggae.html
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